RONA SILVA: A ESCOLHA PELO ECODESIGN E A IDENTIDADE CULTURAL ALAGOANA
Com o talento de
perceber múltiplas possibilidades para a reutilisação do lixo, o designer
alagoano Ronaldo Edson da Silva explora formas arrojadas e mecanismos criativos
para criar objetos úteis, ecologicamente corretos e super práticos no
dia-a-dia. Mas, suas obras se destacam, sobretudo, pela presença de elementos
que remetem as manifestações populares que presenciou durante a infância. Sua
memória afetiva dá contorno e textura às suas criações, atribuindo ao lixo o
status de arte. Mesmo assim, Rona é pouco conhecido em sua terra natal
Por Francisco
Ribeiro e Elayne Pontual
O termo design sustentável é recente, surgiu em meados da década de
1990, e desde então vem despontando no mercado mundial como uma saída para a
redução do consumo de matéria-prima, de energia e do lixo gerado por meio da
fabricação de um produto até o seu descarte.
Com possibilidades diversas, a proposta do ecodesign – como também é
denominado essa vertente do design – foi introduzida no trabalho de artistas e
profissionais da área, cujo conceito é norteado também pela preocupação em
traçar novos caminhos na defesa do uso de materiais locais e na reflexão sobre
a identidade.
Influenciado por tal perspectiva, o designer de produtos e professor
universitário Rona Silva, 53, adotou o conceito em seus trabalhos e vem
ganhando cada vez mais a projeção dentro e fora do País – ainda que para ele a
atividade seja também um “hobby”.
À frente do Studio Carapanã Design, Rona converteu sobras de papelão em mobiliário, luminárias e objetos decorativos para residências (Foto: Divulgação) |
“Minhas criações surgem de uma
atividade que gosto muito de fazer nas horas vagas e serve como pesquisa de
ecodesign e sustentabilidade. Os resultados dos experimentos são empregados nos
produtos artesanais e nas aulas que ministro”, disse.
O alagoano expôs na Bienal Brasileira
do Design, em 2010. No ano passado, os europeus puderam conferir suas peças
numa mostra de design brasileiro, em Amsterdã.
À frente do Studio Carapanã Design,
Rona lançou as coleções AGUUU! e Par de Jarros. Ele converteu sobras de papelão
em mobiliário, luminárias e objetos decorativos para residências. Sua
inspiração vem das festas populares nordestinas, do estilista japonês Kenzo
Takada e da teoria do caos, cuja máxima “há ordem na desordem e desordem na
ordem” encontra respaldo nas diferentes texturas presentes em suas obras, que
fazem surgir uma inesperada harmonia.
Como começou
Enquanto seus quatro irmãos iam jogar
bola nas ruas pacatas do município de Murici, Rona Silva ficava em casa,
recolhendo descartes para montar seus brinquedos. Aos 6 anos de idade, ele
descobriu a técnica ideal para a confecção de aviões, carrinhos, entre outros
objetos, que perduraria até hoje: o corte, a dobra, a cola e o encaixe.
As manifestações populares que
presenciou ainda garoto também permaneceriam presentes em suas lembranças,
compondo parte de sua memória afetiva e que mais tarde daria contorno e textura
às suas obras.
Mas foi somente na fase adulta, com a
passagem pelos cursos de Mecânica do Ifal (antiga Escola Técnica Federal de
Alagoas), de Engenharia Mecânica da Universidade Federal da Paraíba e de
Desenhos Industrial na Universidade Federal de Campina Grande, que Rona trouxe
à tona todo repertório adquirido durante a infância.
“O conceito ‘do it yourself!’ [em
português: faça você mesmo!] ganhou uma dimensão muito importante na construção
de minhas criações. Isso se deu de tal maneira que todo meu trabalho pode ser
feito de forma manual, semi-industrial, industrial e não necessita de
ferramenta para montar”, disse o alagoano, explicando em seguida os passos que
levaram suas coleções a ganharem reconhecimento nacional e internacional.
Papelões encaixados dão origem a cadeiras resistentes (Foto: Divulgação) |
“Em 2009, criei meu blog, Carapanã
Design, incentivado pelos amigos e pelos alunos. Lá, publiquei algumas fotos
das minhas peças. Depois de certo tempo, comecei a receber ligações de editores
de revistas, pessoas ligadas à moda e empresas de móveis, de todo o país,
interessadas no produto”, contou.
Do que é feito?
A matéria-prima para a composição de
seus trabalhos veio, principalmente, do lixo do prédio onde mora e tecidos
coletados em ateliês ou, em alguns casos, adquiridos em lojas populares do
centro de Maceió.
“Certo dia, recebi uma visita
especial em meu apartamento: era o estilista Fernando Perdigão. Ele viu no chão
uma cobra feita com tampas de garrafas de refrigerante e ficou bastante
interessado no produto.
Tamborete Cabelo, uma das criações do alagoano Rona (Foto: Divulgação) |
Recentemente, fui convidado por ele
para desenvolver uma linha de acessórios para compor as peças do desfile
realizado no TrendHouse e usei como base esse mesmo conceito e, também, a
matéria-prima”, rememora.
O resultado do trabalho irá compor a
coleção Cobra Grande, que está em finalização.
Depois de várias idas e vindas a
Alagoas, Rona continuou encontrando dificuldades para produzir suas peças no
Estado. “Já recebi convite da Micasa, uma das mais importantes lojas de móveis
do País, para produzir uma grande quantidade de Poltronas Matuta, mas por conta
da dificuldade em encontrar matéria-prima suficiente e mão-de-obra, tive que
deixar de lado a proposta. Pelo menos, nesse momento. Além disso, quase não há
incentivo do governo para o design local”, observou.
Apesar das adversidades, o Rona não
desanima e permanece em busca de diferentes matérias-primas para sua nova
coleção.
“Estou pesquisando sobre os roletes
de cana, especificamente o palito que é usado para espetar os pedaços de cana.
Ele se assemelha a estrutura de mobiliário. Provavelmente, irei lançar uma
coleção com objetos feitos desse material. Sempre inserindo neles elementos
vindos da minha memória afetiva e das manifestações populares que presenciei em
Alagoas”, afirmou.
Pesquisa acadêmica
Rona não é o único alagoano a se
interessar por design sustentável. A aluna do curso tecnológico de Design de
Interiores, do Instituto Federal de Alagoas (IFAL), Ingrid Nicácio Ferreira,
defendeu seu Trabalho de Conclusão de Curso (TCC) em 2011, intitulado “Uma
discussão do design sustentável: proposta experimental para mobiliário com
tubos de papelão”. O trabalho segue o princípio do ecodesign, propondo a
discussão sobre a sustentabilidade, através da reutilização de materiais
descartados na natureza.
Ingrid fez parte do Núcleo de
Pesquisa em Design (NPDesign), trabalhando com a professora e pesquisadora
Áurea Rapôso no projeto MobPET, que busca reflexões a cerca de mobiliários com
garrafas pet. Foi através do MobPET que a aluna não só pensou seu TCC como
imaginou um novo projeto, desta vez inspirado em mobiliários construídos com
papelão, o MobPAPER.
“A Ingrid tem um perfil diferenciado.
Ela faz parte daquele grupo de alunos que não se interessam apenas pelo
diploma, mas que buscam também a extensão e a pesquisa”, revela Áurea.
A ex aluna de Áurea ainda fez parte
de oficinas e cursos voltados para a comunidade, um deles foi realizado na Vila
Emater II, antiga favela do Lixão de Alagoas. Os projetos MobPET e MobPAPER
resultaram em diversos trabalhos científicos, nacionais e internacionais, e
estão disponibilizados gratuitamente na internet.
Uma das questões mais discutidas na
Banca Examinadora foi a lógica de consumo da sociedade atual. “Não são as
pessoas, individualmente, que vão dar um fim aos problemas ambientais. Há todo
um sistema de ações e de atores, como os produtores, as empresas e os
designers. Todos estão interligados”.
“Se todos não repensam essa questão
da lógica do consumo, a gente fica sem possibilidades de ponderar um futuro promissor
para a habitação nesse planeta. Projetos desse tipo são interessantes para que
os seres humanos reflitam um pouco sobre questões que estão relacionadas à
nossa época”, esclareceu a professora.
Uma função importante do projeto
apresentado por Ingrid é a disseminação e divulgação no ambiente acadêmico. “Eu
vejo o TCC da Ingrid como um trabalho que pode vir a ter um efeito
multiplicador positivo no âmbito acadêmico do Ifal e de outras Instituições
locais, ou até mesmo contribuir nacionalmente para essa discussão”, afirmou
Áurea.
Segundo a professora, a academia
enfrenta uma carência de estudos específicos que abordem a relação da
sustentabilidade com o Design, com as cadeias produtivas, com o produto, o
consumo e o mercado.
A principal contribuição que pessoas
como Ronan e Ingrid oferecem à sociedade, é a refleção sobre a politização das
práticas que são feitas por todos os agentes, que não se resume ao design, mas
a toda sociedade que compra, consome e gera demandas. Além dos empresários, dos
distribuidores e dos fornecedores que alimentam a cadeia de produção.
Para Áurea, “o
trabalho destes alagoanos traz à tona temáticas atuais que ajudam na
modificação do pensamento e da conduta em relação aos recursos e ao espaço de
habitação que nós ainda temos”. E.P.|F.R.
Já viu as novas bolsas feitas pelo Rona Silva? Eu amo, são as Bolsas Anunciada do projeto dele Carapanã Design https://br.pinterest.com/luiza_sahara/moda-sustent%C3%A1vel-bolsa-anunciada/
ResponderExcluirO link do instagram do projeto: https://www.instagram.com/anunciada.br/
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